— Sabemos toda a representatividade que a economia americana tem e por isso o medo de que uma recessão por lá se espalhe para o mundo. Com uma recessão nos Estados Unidos, vendemos menos para lá e isso acaba nos afetando via canal de comércio e também com impacto nas moedas, pelo câmbio — lembra Baggio.
O entendimento geral dos especialistas é de que o comércio internacional sai perdendo com a nova política de tarifas imposta por Trump. No entanto, reconhece-se que há espaço para oportunidades.
No caso brasileiro, que ficou entre os países com as menores alíquotas aplicadas, existe a chance de buscar novos mercados e novos itens a exportar. A questão, levanta o presidente Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, é se o Brasil vai saber se colocar.
— Oportunidade existe, mas tem que saber atender à demanda que surge.
O presidente cita a questão de preços como um dos entraves para o Brasil se tornar mais competitivo, sobretudo na fabricação de manufaturados, que inclui custos de logística e produção.
— Ocupar o espaço da China, por exemplo, é uma hipótese que existe, mas está distante, porque estamos longe de competir com os preços chineses — diz Castro.
Na avaliação da Fiergs, o momento é oportuno para reorganizar a lógica fabril.
— Ficou relativamente “barato” para o Brasil e temos que saber aproveitar. E, para isso, tem que melhorar nossa competitividade de forma ampla: com infraestrutura e qualificação da mão de obra, que são grandes problemas que as indústrias enfrentam — diz Baggio.
Produção agrícola
Motor da economia brasileira, o agronegócio é um dos setores mais sensíveis às dinâmicas do mercado global. E não sai ileso quando a guerra envolve duas das maiores potências em produção e consumo de commodities.
Renan Hein dos Santos, assessor de Relações Internacionais da Federação da Agricultura do Estado (Farsul), aponta como efeito imediato da trama tarifária a valorização do prêmio da soja, que, neste caso, é benéfica ao produtor brasileiro.
O prêmio é um ajuste de preço aplicado a produtos agrícolas comercializados no mercado internacional. Esse ajuste pode ser positivo ou negativo, a depender do contexto econômico, e leva em consideração a logística e os custos de exportação. Quando há redução de oferta por parte de um importante fornecedor — no caso, por motivo tarifário —, o prêmio fica positivo para outros países fornecedores.
— Infelizmente, viemos de uma quebra de safra (no Rio Grande do Sul), porque seria um bom momento para “surfar”. A China é grande importadora de soja, mas não é viável para eles comprarem dos Estados Unidos com este contexto tarifário, então o Brasil ganha uma grande oportunidade — explica Santos.
A associação norte-americana de soja (American Soybean Association, em inglês) já se mostra preocupada com o plantio da próxima safra de grãos no país. Isso porque a disponibilidade de mercados para escoar é determinante para traçar o tamanho da produção. Neste caso, novamente, abre-se uma janela para a colheita do Brasil.
— Com o principal cliente deles não comprando, como fica a safra americana de verão? Se os Estados Unidos diminuírem a área, vai diminuir a oferta — alerta o assessor da Farsul.
Outros produtos
Além da soja, o milho e a carne brasileira também podem se beneficiar da guerra comercial. A fabricação de calçados, com polo nacional cravado no RS, é outra com espaços a explorar.
No longo prazo, ainda se tratando dos grãos, o tarifaço pode respingar no mercado de biocombustíveis, no qual os EUA têm protagonismo e o Brasil desponta como grande produtor, inclusive com participação relevante do Rio Grande do Sul.
Outro efeito no agronegócio vem da instabilidade do câmbio. Ao mesmo tempo que a valorização do dólar frente ao real pode beneficiar uma venda, ela pode encarecer a implantação das próximas lavouras devido ao preço dos insumos, muitas vezes cotados na moeda estrangeira.