O que são as ações ordinárias?

Quando você decide entrar na Bolsa de Valores, se depara com uma sopa de letrinhas e números: PETR3, PETR4, VALE3, ITUB4. Para o investidor iniciante, isso pode parecer apenas códigos aleatórios, mas a diferença entre o número 3 e o número 4 no final de um código pode mudar completamente o seu destino como investidor.

Você está comprando apenas um direito de receber lucros ou está comprando o direito de sentar à mesa com os donos? É aqui que entram as Ações Ordinárias (ON).

Neste dossiê completo, vamos desvendar tudo sobre as ações ordinárias. Você entenderá por que os maiores investidores do mundo, como Warren Buffett (e no Brasil, Luiz Barsi), dão tanta importância a esse tipo de papel. Vamos mergulhar nos conceitos de governança corporativa, direito a voto, Tag Along e te mostrar por que, para quem pensa no longo prazo, as ações ordinárias podem ser a melhor escolha.

O Conceito Fundamental: O Que Significa “Ação Ordinária”?

Para entender o que é uma ação ordinária, precisamos voltar à essência do que é a Bolsa de Valores. A bolsa não é um cassino; é um local de negociação de frações de empresas.

Uma Ação Ordinária (ON) é a representação mais pura dessa fração. O termo “ordinária” aqui não significa algo ruim ou comum no sentido pejorativo, mas sim algo que segue a “ordem” natural das coisas: a propriedade.

Ao comprar uma ação ordinária, você está adquirindo direito a voto nas assembleias da empresa. Na prática, você se torna um sócio com voz ativa. É claro que, se você tiver apenas 100 ações de uma empresa que possui 1 bilhão de ações, o seu voto terá um peso proporcionalmente pequeno. Porém, a natureza jurídica do seu papel é a mesma do acionista controlador (o dono).

Como identificá-las?

No Brasil, as ações ordinárias são identificadas pelo número 3 no final do código de negociação (ticker).

• VALE3 (Vale S.A.)

• WEGE3 (WEG S.A.)

• BBAS3 (Banco do Brasil)

A Batalha das Siglas: Ações Ordinárias (ON) vs. Preferenciais (PN)

Esta é a dúvida número um de todo investidor iniciante. Se existem as ações Ordinárias (ON – final 3), por que existem as Preferenciais (PN – final 4)? E qual eu devo escolher?

Para simplificar, imagine uma empresa familiar:

1. O Acionista Ordinário (ON): É o irmão que ajuda a administrar, vota nas reuniões de família e decide o futuro do negócio. Ele tem poder político.

2. O Acionista Preferencial (PN): É o primo que não quer se envolver com a administração, não quer votar, mas quer ter a “preferência” na hora de receber a mesada (os dividendos). Se a empresa falir, ele também tem preferência no reembolso do capital.

Resumo das Diferenças:

• ON (Ordinária): Foco no Poder. Confere direito a voto e possui Tag Along (falaremos disso a seguir). É a ação do “dono”.

• PN (Preferencial): Foco nos Dividendos. Tem prioridade no recebimento de proventos e, geralmente, recebe 10% a mais de dividendos que a ON (embora isso varie conforme o estatuto). Não dá direito a voto.

Tendência de Mercado:

Nos Estados Unidos, mercado mais desenvolvido do mundo, praticamente só existem ações ordinárias (Common Stock). A existência de ações PN é uma jabuticaba brasileira que está caindo em desuso com o avanço da governança corporativa.

O Que é Tag Along? A Proteção de Ouro do Acionista ON

Se existe um motivo técnico forte para você escolher ações ordinárias, esse motivo se chama Tag Along. Este é um conceito avançado, mas explicaremos de forma simples.

Imagine que você comprou ações de uma empresa porque confia na gestão atual. De repente, uma multinacional gigante decide comprar essa empresa e assume o controle. Os donos originais vendem a parte deles e saem ricos. E você, pequeno investidor? Você fica “preso” com o novo dono, que você nem conhece?

O Tag Along é um mecanismo de proteção legal. Ele obriga que, caso o controle da empresa seja vendido, o comprador faça uma oferta pelas suas ações também.

Como funciona na prática?

Pela legislação brasileira (Lei das S.A.):

• Ações Ordinárias (ON): Têm garantia de Tag Along de, no mínimo, 80%. Isso significa que se o controlador vendeu a ação dele por R$ 100,00, o comprador é obrigado a oferecer pagar pelo menos R$ 80,00 na sua ação ON.

• Ações Preferenciais (PN): Não têm garantia de Tag Along pela lei (embora o estatuto da empresa possa oferecer). Se não tiver, o controlador vende a parte dele, e a sua ação PN pode “derreter” no mercado sem que ninguém seja obrigado a comprá-la.

Muitas empresas do Novo Mercado (o mais alto nível de governança da B3) oferecem 100% de Tag Along para as ações ordinárias. Isso garante que o pequeno investidor receba exatamente o mesmo valor por ação que o dono da empresa recebeu na venda. É o alinhamento total de interesses.

O “Novo Mercado” e a Extinção das Ações Preferenciais

Você já notou que algumas das empresas mais famosas da bolsa, como a Magazine Luiza (MGLU3), a Localiza (RENT3) e a B3 (B3SA3), só têm ações com final 3?

Isso acontece porque elas fazem parte do Novo Mercado. Este é um segmento criado pela B3 para empresas que se comprometem voluntariamente com as melhores práticas de governança corporativa.

A regra número 1 do Novo Mercado é: A empresa só pode emitir ações ordinárias.

A lógica é acabar com a distinção entre “quem manda” e “quem financia”. No Novo Mercado, existe o princípio de “uma ação, um voto”. Isso traz muito mais transparência e segurança para o investidor estrangeiro e para você. Portanto, ao ver uma empresa que só tem final 3, você já sabe que ela possui, em tese, um nível de governança superior.

Ações Ordinárias Pagam Menos Dividendos? Desmistificando

Muitos investidores fogem das ações ordinárias porque ouviram dizer que “elas pagam menos”. Isso é uma meia-verdade que precisa ser analisada com cuidado.

Por lei, as ações Preferenciais (PN) devem ter alguma vantagem patrimonial para compensar a falta de voto. Geralmente, essa vantagem é receber dividendos 10% maiores que as Ordinárias.

Porém, existem dois cenários onde isso não importa:

1. Empresas do Novo Mercado: Como só existem ações ON, todos recebem o mesmo dividendo.

2. Políticas de Dividendos Paritárias: Muitas empresas antigas, que possuem ON e PN (como o Banco do Brasil), pagam o mesmo valor de dividendo para ambas as classes de ações, por liberalidade ou estatuto.

Portanto, antes de escolher a PN só pelo dividendo, verifique o histórico de pagamentos. Muitas vezes a diferença é de centavos e não compensa a perda da proteção do Tag Along que a ON oferece.

Liquidez: O Calcanhar de Aquiles das Ações ON (Em Empresas Antigas)

Se as ações ordinárias são tão boas, por que alguém compraria as preferenciais? A resposta está na Liquidez.

Em empresas muito antigas e tradicionais (como Petrobras, Gerdau, Eletrobras), a maioria das negociações acontece nas ações Preferenciais (final 4). Isso ocorre por um fator histórico: antigamente, os donos emitiam muitas ações PN para captar dinheiro sem perder o controle da empresa (já que PN não vota).

Consequentemente:

• Petrobras (PETR4 – PN): Tem liquidez gigantesca, fácil de comprar e vender milhões em segundos.

• Petrobras (PETR3 – ON): Tem boa liquidez, mas menor que a PN.

Para o pequeno investidor que movimenta R$ 1.000, R$ 10.000 ou até R$ 100.000, a liquidez da ação ON de grandes empresas geralmente é suficiente. O problema de liquidez na ON só costuma afetar grandes fundos ou empresas de menor porte (“Small Caps”) onde a ação ON quase não tem negócios diários.

Dica de Ouro: Sempre verifique o volume médio diário de negociações. Se a ação ON negociar muito pouco, o “spread” (diferença entre preço de compra e venda) pode ser alto, tornando a operação mais cara para você.

Perfil do Investidor: A ON é para Você?

Investir em ações ordinárias é uma questão de mentalidade. Veja se você se enquadra:

O Investidor Sócio (Buy and Hold)

Se o seu objetivo é montar uma carteira de aposentadoria, comprar ações para segurar por 10, 20 ou 30 anos, as Ações Ordinárias são, sem dúvida, a melhor opção.

No longo prazo, empresas são vendidas, fundidas ou reestruturadas. Ter o voto e o Tag Along garante que você não será deixado para trás nessas movimentações. Você quer ser tratado como dono.

O Trader (Curto Prazo)

Se você quer apenas comprar de manhã e vender à tarde (Day Trade) ou fazer operações de poucas semanas (Swing Trade), a Ação Preferencial (PN) pode ser melhor, caso ela tenha mais liquidez. O Trader não está preocupado com governança ou Tag Along, ele quer facilidade para entrar e sair rápido do mercado.

Como Comprar Ações Ordinárias: O Passo a Passo

O processo para adquirir uma ação ON é idêntico ao de qualquer outro ativo na bolsa.

1. Abra conta em uma corretora: Escolha uma instituição confiável e com taxas competitivas (muitas hoje oferecem corretagem zero).

2. Acesse o Home Broker: É a plataforma onde você envia as ordens.

3. Digite o Ticker Correto: Lembre-se, final 3. Se você quer ações ordinárias do Banco do Brasil, digite BBAS3. Se digitar BBAS, o sistema não encontrará.

4. Defina a Quantidade e Preço: O lote padrão é de 100 ações. Se quiser comprar menos (entre 1 e 99), coloque a letra “F” no final (ex: BBAS3F) para acessar o mercado fracionário.

5. Envie a Ordem: Assim que houver um vendedor aceitando seu preço, a ação é sua.

Perguntas Frequentes (FAQ) sobre Ações Ordinárias

Para garantir que não restou nenhuma dúvida, selecionamos as perguntas mais comuns enviadas por nossos leitores:

1. Posso ir à assembleia da empresa tendo apenas uma ação ON?

Sim! Pela lei, qualquer acionista ordinário tem direito a participar. Hoje, muitas assembleias são digitais, permitindo o voto à distância. Na prática, seu voto unitário não mudará o rumo da empresa, mas é um exercício de cidadania corporativa.

2. Ações ON valorizam mais que as PN?

No longo prazo, estudos mostram que ações com melhor governança tendem a performar melhor. Em momentos de crise ou rumores de venda da empresa, a ação ON costuma sofrer menos ou até subir mais devido à garantia do Tag Along.

3. O que são as Units (Final 11)?

As Units são “pacotes” que misturam ações ON e PN. Por exemplo, uma Unit da Sanepar (SAPR11) pode conter 1 ação ON e 4 ações PN. Ao comprar a Unit, você leva o pacote fechado. É uma forma de aumentar a liquidez.

4. Vale a pena trocar minhas ações PN por ON?

Se você é um investidor de longo prazo e a empresa oferece boa liquidez na ON, muitos especialistas recomendam a migração para a ON visando maior proteção patrimonial. Porém, considere os custos de corretagem e imposto de renda nessa troca (vender uma para comprar a outra).

A Escolha Inteligente para o Longo Prazo

Escolher entre ações ordinárias e preferenciais vai muito além de uma simples letra ou número no final do código. É uma escolha sobre como você enxerga seu dinheiro.

Se você vê a Bolsa de Valores apenas como um local para especular e tentar ganhar uns trocados rápidos, a governança pouco importa. Mas, se você vê a Bolsa como um mecanismo para se associar a grandes projetos, gerar renda passiva vitalícia e construir um patrimônio sólido, as Ações Ordinárias (ON) são o veículo mais seguro para essa jornada.

Elas alinham seus interesses aos dos controladores, protegem seu patrimônio em caso de venda da empresa e garantem que você seja tratado como o que realmente é: um sócio.

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