Dívida mais alta, impulsionada pelos gastos públicos nos últimos anos, pressiona taxa de juros brasileira, restringindo o crescimento do país.
A dívida do setor público consolidado registrou alta de um ponto percentual em julho, atingindo 77,6% do PIB — o equivalente a R$ 9,6 trilhões, segundo dados do Banco Central.
A metodologia utilizada no cálculo do indicador, entretanto, não observa as normas internacionais. Em nota, o Banco Central informou que seu método, utilizado desde 2008, “reflete as características institucionais brasileiras”.
➡️ No padrão do Fundo Monetário Internacional (FMI), referência para comparação internacional — que inclui títulos públicos que estão na carteira do BC no endividamento brasileiro —, a dívida do país é muito maior: 90% do PIB (patamar de julho).
🔎 A dívida do setor público consolidado é um conceito fiscal que representa o montante total das obrigações financeiras assumidas por um ente da Federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), apurado sem duplicidade.
👉 Os títulos públicos na carteira do BC, que a autoridade monetária não contabiliza em seu conceito de dívida do setor público, são utilizados para regular a liquidez no mercado e o custo dos juros (taxa Selic) no curto prazo, que está atualmente em 15% ao ano.
Por que isso é importante?
💵 A relação entre dívida e PIB é um indicador relevante para o mercado financeiro, interpretado como um sinal da capacidade do país de honrar seus compromissos financeiros de curto, médio e longo prazo. Quanto maior o indicador, maior o risco de um calote em momentos de crise.
➡️ Além disso, com uma dívida mais alta, impulsionada pelos gastos públicos nos últimos anos, há uma pressão maior sobre a taxa de juros brasileira. Isso se reflete nos juros cobrados pelo mercado financeiro do setor produtivo da economia, restringindo o crescimento do país.
Recomendação do FMI
Segundo o BC, em agosto do ano passado, o FMI avaliou a adequação das estatísticas fiscais do Brasil às regras internacionais, a pedido do Tesouro Nacional brasileiro.
Na ocasião, o BC informou que o FMI reafirmou sua metodologia e recomendou que o Brasil passe a adotar seu formato de cálculo, incluindo na dívida todos os títulos emitidos pelo Tesouro Nacional na carteira do BC.
“A adoção dessa e das demais recomendações ainda depende da análise dos compiladores nacionais, entre outros, referente à sua adequação ao arcabouço institucional do país”, acrescentou o Banco Central.
Comparação internacional
Quando utilizado o critério internacional de comparação, calculado pelo FMI, a dívida brasileira, que terminou 2024 em 87,3% do PIB, ficou:
- longe de economias emergentes, cujo patamar somou 69,5% do PIB no fim do ano passado, e também de países da América Latina (70% do PIB);
- acima da média de nações do Oriente Médio e Ásia Central, assim como de países da África Subsaariana;
- muito próximo do padrão de países da Zona do Euro;
- abaixo de economias avançadas e de países do G7 (sete maiores economias do mundo).
Relatório do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) recomendou em 2023 que os países da América Latina e Caribe reduzam sua dívida pública para um patamar entre 46% a 55% do PIB. O objetivo seria aumentar a confiança dos investidores e possibilitar a redução da taxa de juros, com efeitos positivos sobre o nível de atividade e sobre o emprego.
Essa é a mesma posição externada em 2023 pelo ex-presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, indicado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL). Para ele, a comparação apropriada para o nível da dívida pública brasileira deve ser feita com os demais países emergentes.
“Não adianta querer se comparar com os Estados Unidos”, acrescentou, na ocasião.
Também no ano retrasado, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, avaliou que dívida brasileira não precisa estar no mesmo patamar dos emergentes porque há “diferenciais importantes” na economia brasileira, como praticamente ausência de dívida em dólar e mercado financeiro doméstico desenvolvido, entre outros.
“É difícil falar sobre isso, é uma mega discussão. A Índia tem divida maior do que a nossa, é um país também em desenvolvimento. Cresce bastante, tem uma trajetória estável de dívida, e segue o jogo. Comparar o Brasil com a América Latina? O Brasil é mais comparável com a Índia ou com o Peru?”, questionou o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, em 2023.