Você já parou para olhar o “home broker” ou o aplicativo da sua corretora e se perguntou: por que este número não para de mudar? Em um segundo, a ação está valendo R$ 20,00; no próximo, cai para R$ 19,95 e, de repente, salta para R$ 20,10. O que move esses ponteiros? Existe alguém em uma sala escura decidindo os valores?
A resposta curta é: não. O mercado é um organismo vivo, composto por milhões de participantes. Mas entender a dinâmica de formação de preços é o que separa o apostador do investidor inteligente.
Neste artigo completo, vamos desmistificar a Bolsa de Valores. Você entenderá exatamente como o preço de uma ação é definido diariamente, desde a lei básica da oferta e demanda até os robôs de alta frequência que operam em milissegundos.
1. A Lei da Oferta e da Procura: O Motor Invisível do Mercado

Para entender como o preço de uma ação é definido, precisamos voltar à regra mais básica da economia: a Lei da Oferta e da Demanda. Esqueça os gráficos complexos por um momento e imagine uma feira livre.
Se há apenas uma barraca vendendo tomates e cem pessoas querendo comprar, o feirante pode aumentar o preço. O tomate é escasso, e o desejo (demanda) é alto. Por outro lado, se há cem barracas de tomate e apenas um cliente, os feirantes terão que baixar o preço para tentar vender. A oferta é alta e a demanda é baixa.
Como isso funciona na Bolsa (B3)?
Na Bolsa de Valores, a “mercadoria” são as ações (pequenos pedaços de empresas).
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Força Compradora (Touros/Bulls): Se muitas pessoas querem comprar ações da Petrobras (PETR4) hoje, e poucas querem vender, os compradores começam a oferecer preços cada vez mais altos para convencer alguém a vender. O preço sobe.
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Força Vendedora (Ursos/Bears): Se sai uma notícia ruim e todo mundo quer se livrar das ações, mas ninguém quer comprar, os vendedores precisam aceitar preços cada vez menores para conseguir sair do investimento. O preço cai.
Portanto, o preço que você vê na tela é, na verdade, o preço do último negócio realizado. Ele representa o ponto de equilíbrio momentâneo onde um comprador e um vendedor concordaram em fechar negócio.
2. O Livro de Ofertas (Book): Onde a Mágica Acontece
Muitos iniciantes acham que o preço é definido pela empresa. Não é. A empresa (como a Vale ou o Itaú) não controla a cotação diária de suas ações. Quem controla é o Livro de Ofertas.
O Livro de Ofertas é uma fila eletrônica de intenções. Imagine duas filas indianas frente a frente:
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Fila de Compra: Organizada do maior valor para o menor. Quem paga mais, fica em primeiro lugar na fila.
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Fila de Venda: Organizada do menor valor para o maior. Quem vende mais barato, fica em primeiro lugar na fila.
O “Spread” e o Negócio
Digamos que a fila esteja assim:
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Melhor comprador: Aceita pagar R$ 10,00.
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Melhor vendedor: Só aceita vender por R$ 10,05.
Nesse momento, não sai negócio. Existe um “vazio” de 5 centavos entre eles (chamado de Spread). O preço só muda quando:
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O comprador perde a paciência e aceita pagar R$ 10,05 (agredindo a venda).
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Ou o vendedor perde a paciência e aceita vender por R$ 10,00 (agredindo a compra).
Assim que esse encontro acontece, o preço da ação na tela de todos os investidores do mundo é atualizado para o valor desse negócio.
3. Fatores Microeconômicos: O Impacto das Notícias da Empresa
Embora a oferta e a demanda movam o preço no curto prazo, o que faz as pessoas quererem comprar ou vender? Um dos principais motores são os fundamentos da própria empresa.
Resultados Trimestrais e Balanços
A cada três meses, as empresas listadas na Bolsa precisam divulgar quanto lucraram (ou perderam).
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Expectativa x Realidade: O mercado vive de expectativas. Se o mercado esperava que uma empresa lucrasse 1 bilhão e ela lucra “apenas” 800 milhões, as ações podem cair, mesmo com lucro. Por quê? Porque a expectativa (que estava precificada) foi frustrada.
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Dividendos: Anúncios de pagamento de proventos (distribuição de lucros) costumam atrair compradores, elevando o preço momentaneamente.
Escândalos e Governança
Notícias sobre corrupção, troca repentina de CEO ou problemas judiciais geram incerteza. O mercado financeiro odeia incerteza. Diante do medo, a reação natural é vender, empurrando o preço para baixo.
4. Fatores Macroeconômicos: Como a Economia do País Afeta sua Ação

Você já viu uma ação de uma empresa excelente cair, mesmo quando a empresa está indo bem? Isso acontece devido ao Risco Sistêmico ou cenário macroeconômico. O preço da ação não vive em uma bolha; ele depende da saúde do país e do mundo.
A Taxa Selic (Juros)
Esta é a maior “rival” da Bolsa. Quando a Taxa Selic sobe, a Renda Fixa fica mais atraente. O investidor conservador pensa: “Por que vou correr risco na Bolsa se posso ganhar 12% ao ano garantido no Tesouro Direto?”.
Isso causa uma migração de capital: os investidores vendem ações (aumentando a oferta/pressionando preços para baixo) e vão para a Renda Fixa.
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Regra geral: Juros sobem, Bolsa tende a cair. Juros caem, Bolsa tende a subir.
A Cotação do Dólar
Para empresas exportadoras (como a Suzano ou a Vale), a alta do dólar é ótima, pois elas recebem em dólar e pagam custos em real. Suas ações tendem a subir.
Já para empresas que importam produtos ou têm dívidas em dólar (como algumas companhias aéreas ou varejistas), a alta da moeda americana é péssima, derrubando suas ações.
O Cenário Político
Em países emergentes como o Brasil, a política tem peso enorme. Declarações do governo sobre gastos públicos, reformas fiscais ou interferência em estatais alteram a percepção de risco dos investidores estrangeiros. Se o “gringo” (que detém grande parte do volume da nossa bolsa) decide tirar o dinheiro do país, os preços despencam.
5. O Leilão de Abertura e Fechamento: Momentos Críticos do Dia
Você sabia que o preço da ação começa a ser “brigado” antes mesmo do mercado abrir?
O Leilão de Pré-Abertura (9:45 às 10:00)
Quinze minutos antes do pregão oficial, ocorre um leilão. Os investidores enviam ordens de compra e venda, mas nenhum negócio é fechado. O sistema da B3 calcula um preço teórico onde o maior número possível de negócios aconteceria.
É por isso que, às vezes, uma ação fecha o dia anterior a R$ 15,00 e já abre o dia seguinte a R$ 15,50 (o chamado “Gap de Alta”).
O Call de Fechamento
Nos minutos finais do pregão, ocorre outro leilão para definir o preço oficial de fechamento. É um momento de alta volatilidade, onde grandes fundos ajustam suas carteiras, definindo o preço final que aparecerá nos jornais e sites de notícias.
6. High Frequency Trading (HFT): Os Robôs que Movem o Mercado
Hoje em dia, a imagem daquele operador gritando no telefone ficou no passado. Estima-se que mais de 50% do volume diário da Bolsa seja movido por algoritmos e robôs de investimento (HFT – High Frequency Trading).
Esses supercomputadores são programados para identificar micro variações de preço e realizar milhares de operações por segundo.
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Eles leem notícias em milissegundos.
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Eles identificam grandes ordens de compra e tentam se antecipar.
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Eles proveem liquidez ao mercado.
Como isso afeta você?
Às vezes, uma ação cai 2% ou 3% em segundos sem motivo aparente (nenhuma notícia saiu). Isso pode ser um movimento de “manada” dos robôs reagindo a algum indicador técnico. Para o investidor de longo prazo, isso é apenas ruído, mas explica a volatilidade “nervosa” do dia a dia.
7. A Psicologia do Investidor: Medo e Ganância

Não podemos ignorar que, por trás de cada ordem (ou de quem programou o robô), existe um ser humano. A Bolsa de Valores é, em última instância, um reflexo do comportamento humano.
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Efeito Manada: Quando uma ação começa a subir muito rápido, o medo de ficar de fora (FOMO – Fear Of Missing Out) faz com que pessoas comprem a qualquer preço, inflando o valor artificialmente (criando bolhas).
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Pânico: Quando o mercado cai, o medo da perda faz com que investidores vendam no fundo do poço, aceitando qualquer preço para estancar a dor da perda, derrubando a cotação ainda mais.
Benjamin Graham, mentor de Warren Buffett, dizia que “No curto prazo, o mercado é uma urna de votação (emocional); no longo prazo, é uma balança (racional)”. O preço diário é a votação; o valor real é a balança.
8. Circuit Breaker: O Botão de Pânico da Bolsa
Para evitar que o pânico destrua o mercado em dias de extrema volatilidade, existe um mecanismo de segurança chamado Circuit Breaker.
Se o Índice Bovespa (Ibovespa) cair 10% em relação ao fechamento anterior, os negócios são paralisados por 30 minutos. Se ao voltar, cair 15%, para por 1 hora.
Isso serve para “esfriar a cabeça” dos investidores e permitir que as informações sejam assimiladas racionalmente, evitando que o preço das ações chegue a zero por puro desespero momentâneo.
9. Preço vs. Valor: A Lição Mais Importante
Para encerrar este guia técnico, precisamos fazer uma distinção vital para sua saúde financeira. Preço é o que você paga. Valor é o que você leva.
O preço de uma ação ser definido diariamente pelo humor do mercado não significa que o valor da empresa mudou.
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Se a padaria da sua esquina vale R$ 500 mil hoje, ela não passa a valer R$ 200 mil amanhã só porque choveu e poucos clientes apareceram.
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O mesmo vale para as ações. Se o preço da ação do Banco do Brasil cair 5% hoje porque o dólar subiu, isso não muda o fato de que o banco continua tendo milhões de clientes e gerando bilhões de lucro.
Entender essa diferença permite que você use a volatilidade a seu favor: comprando ações de ótimas empresas quando o “Mercado” (o preço diário) está de mau humor e vendendo barato.
10. Perguntas Frequentes (FAQ)
1. Quem define o preço inicial de uma ação (IPO)?
No IPO (Oferta Pública Inicial), o preço é definido através de um processo chamado Bookbuilding. Investidores institucionais dizem quanto aceitam pagar, e chega-se a um consenso para o preço de estreia. Depois disso, o mercado assume.
2. Posso comprar uma ação a qualquer hora do dia?
No Brasil, o pregão regular geralmente ocorre das 10:00 às 17:00 (o horário pode variar com o horário de verão dos EUA). Existe também o After Market, um período curto após o fechamento onde negociações limitadas podem ocorrer.
3. Por que o preço da minha ação não muda há horas?
Isso acontece com ações de baixa liquidez (Small Caps). Se não há ninguém comprando ou vendendo naquele momento, o último preço negociado permanece estático na tela até que um novo negócio ocorra.
O preço de uma ação é definido diariamente por uma batalha constante entre otimistas (compradores) e pessimistas (vendedores), influenciados por juros, notícias, resultados das empresas e, acima de tudo, psicologia humana.
Entender essa mecânica tira o investidor da posição de “torcedor” e o coloca no controle. Agora que você sabe que a variação diária é normal e faz parte do jogo, pode focar no que realmente importa: a qualidade das empresas onde você investe seu dinheiro.
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